Quase duas décadas após a promulgação da Lei de Arbitragem (9.307/96) surge o Projeto de Lei nº 7108/14, de iniciativa do Senado Federal (PLS nº 406/2013) com o intuito de alterar algumas disposições desta Lei e incluir outras a fim de adequar a legislação ao cotidiano das decisões que já vinham sendo proferidas no Judiciário brasileiro.
O Projeto de Lei encaminhado à Câmara dos Deputados no início deste ano surgiu da iniciativa de um grupo de juristas liderado pelo ministro do Superior Tribunal de Justiça, Luis Felipe Salomão que, após célere tramitação, já se encontra a caminho do Senado para nova análise após a aprovação de emenda ao projeto feita por Comissão Especial da Câmara.
Conforme mencionado, o Projeto veio de forma a atender uma demanda crescente de regulamentação de diversas situações não previstas na Lei de Arbitragem ou cuja solução era de competência do Judiciário, sendo “uma forma de incorporar à lei a jurisprudência já consolidada sobre o assunto não trazendo muitas matérias novas”, conforme afirma Carlos Alberto Carmona. Desse modo, assuntos como arbitragem no setor público, escolha de árbitros, prescrição, tutelas cautelares e de urgência, carta arbitral, sentença arbitral e arbitragem em conflitos societários, foram objeto de alteração ou incorporação à Lei de Arbitragem por meio deste Projeto.
Analisando as sugestões de alterações, observa-se que o legislador foi cauteloso ao dispor sobre a ampliação do uso da arbitragem estabelecendo condições para uso do procedimento em relações de consumo e trabalhistas, quando a cláusula de arbitragem só terá eficácia se sua instituição for de iniciativa do empregado ou consumidor sendo que, nos contratos consumeristas de adesão, tal cláusula deverá ser redigida em negrito e documento apartado. Em ambos os casos, verifica-se uma preocupação na proteção da parte hipossuficiente que somente adotará o procedimento, caso tenha conhecimento e efetivamente deseje que eventuais conflitos sejam resolvidos pela arbitragem.
No que se refere às tutelas cautelares e de urgência, anteriormente de total competência do Poder Judiciário, de acordo com o Projeto, exceto quando a arbitragem ainda não estiver instituída, tais medidas deverão ser proferidas pelo tribunal arbitral que também terá o direito de modificar eventuais decisões anteriormente proferidas pelo Poder Judiciário, o que demonstra não somente um maior poder aos árbitros, quanto uma maior independência ao procedimento de arbitragem.
Além da criação da carta arbitral, uma espécie de requerimento a determinado órgão jurisdicional para que este pratique ou determine que seja cumprido um ato solicitado pelo árbitro, o Projeto também inova ao alterar a competência de homologação das sentenças arbitrais estrangeiras, que antes era do Supremo Tribunal Federal, para o Superior Tribunal de Justiça que também é o competente para homologação de sentenças proferidas por cortes judiciárias estrangeiras.
Outra proposta de mudança deste Projeto que promete bastante repercussão se refere à expressa previsão de arbitragem nos contratos firmados com o poder público. Isso porque, a Lei de Arbitragem originalmente não previa a possibilidade de eleição da arbitragem em contratos firmados com a Administração Pública, ficando a cargo da jurisprudência, por meio de interpretação conjunta da Lei de Concessões (Lei nº 8.987/95) com o art. 1º da Lei de Arbitragem, analisar tal possibilidade no caso de contratos de concessão com a Administração Pública que envolvesse direitos patrimoniais disponíveis.
Neste aspecto, o Projeto veio mais no sentido de incorporar à legislação uma prática já autorizada pelos tribunais do que inovar o uso do procedimento de arbitragem, exceto no que se refere ao alcance da arbitragem que passou a abranger todo o setor público e não somente os contratos de concessão, conforme expresso no art. 1º do Projeto que se refere à arbitragem tanto para a Administração Direta quanto Indireta.
Todavia, as exatas condições nas quais a arbitragem funcionará no setor público ainda dependem de regulamentação, conforme expresso na emenda ao Projeto aprovada em 15 de julho deste ano, o que poderá postergar por mais algum tempo a integral normatização e aplicação das novas regras.
Portanto, as alterações e discretas inovações apresentadas pelo Projeto demonstram uma preocupação efetiva em nosso país de facilitar e investir no uso de um instituto que já se encontra consolidado em nosso ordenamento e amplamente utilizado no meio jurídico como alternativa de solução de conflitos mais célere e especializada, cujas Câmaras e árbitros já alcançaram níveis de organização, seriedade e reconhecimento internacionais.
Ana Lucia Villela was an associate at Pacheco Neto Sanden Teisseire Law Firm.