Nova lei traz avanços importantes, mas deixou a desejar no quesito dos benefícios fiscais
Fonte: Jota
27/01/2019
O presidente Jair Bolsonaro sancionou no acender das luzes de 2019 a Lei Federal 13.800/2019, que instituiu a figura do fundo patrimonial filantrópico no ordenamento legal brasileiro. A lei vem da conversão da Medida Provisória 851/2018 sancionada por Michel Temer em setembro de 2018, como reação do governo ao incêndio no Museu Nacional, que trouxe de volta à pauta a falta de ingerência sobre matérias de interesse cultural e filantrópico no Brasil, além da patente falta de recursos ou de destinação deles à cultura, educação e filantropia.
Nos termos do texto, os fundos patrimoniais têm por objetivo arrecadar, gerir e destinar doações de pessoas e empresas privadas para projetos e programas que sejam de interesse público, esclarecendo mais adiante que os fundos poderão aportar recursos em projetos de educação, à ciência e tecnologia, à pesquisa, inovação, à cultura ,à saúde, ao meio ambiente, à assistência social, aos esportes, aos direitos humanos e a outras finalidades de interesse público.
O fundo patrimonial tem por meta constituir fonte de recursos de longo prazo para investimento visando a perenizar o valor investido, e a constituir fontes de regular e estável de recursos para fomento de finalidades de interesse público. Para gerir o fundo, a gestora do fundo patrimonial tem também regras específicas determinadas no texto legal, estrutura de governança própria e delimitações do escopo de atividade.
No decorrer das semanas que seguiram a publicação da lei, viu-se na mídia e dentro grupos de pessoas interessadas uma leva de reação positiva acerca da promulgação da lei, deixando claro que o assunto de carecia de atenção havia muito tempo.
A legislação veio vetada em algumas partes, e sobretudo na que mais interessava ao potencial doador de recursos: os benefícios fiscais atrelados à destinação de verbas aos fundos filantrópicos. Foram excluídos, desta forma, os artigos anteriormente previstos, de números 28, 29 e 30. O artigo 28 cuidava de incluir as doações às organizações gestoras de fundos patrimoniais dentre as possíveis deduções para efeito de apuração do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido no Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (Lei 9.249/95). O 29 tratava da inclusão das doações às organizações gestoras de fundos patrimoniais no rol das deduções do Imposto de Renda Pessoa Física (Lei 9.250/95).
Finalmente, o artigo 30 tratava de incluir as deduções de doações de pessoa física dentro da limitação global de 6% de Imposto de Renda, da Lei 9.532/97. A razão para o veto foi a de que “as proposições com possibilidades de benefícios tributários dos quais decorram potencial renúncia de receitas devem atender aos requisitos da legislação orçamentária e financeira”.
Com isso, a lei que poderia ter cuidado melhor de constituição de fundos de endowment, acaba tendo sua abrangência e potencial de mudança restritos.
O termo endowment nos remete quase automaticamente aos fundos constituídos por universidades norte-americanas, onde o instituto cresceu e floresceu enormemente. Segundo a seção Money da Revista Time, somente em 2017 os 5 maiores endowments de universidades norte-americanas (em ordem decrescente: Harvard University, Yale University, University of Texas System, Stanford University e Princeton University) somaram aproximadamente 140 bilhões de dólares¹.
Evidentemente este dado coloca em perspectiva o poderio financeiro norte-americano, mas a soma exorbitante faz pensar em quais são os fatores que impulsionam as doações. Um motivo é com certeza o grau de altruísmo do povo americano, que segundo o Gallup (Relatório dos Países Mais Generosos do Mundo de 2018 – disponível online) classifica os Estados Unidos da América como o 4ª país com maior engajamento cívico. O Brasil está em 26º lugar, para fins de comparação². Outro fator que impulsiona certamente a doação são os benefícios fiscais que se obtém de tais contribuições, que variam entre deduções ou créditos, em diferentes níveis, nos âmbitos federal e estadual³.
A iniciativa legal é boa, e um uma sinalização no bom caminho. Traz o instituto do fundo patrimonial filantrópico à vida oficialmente, dando-lhe segurança e solidez, bons contornos de governança, além de um espaço garantido dentro do espectro de contribuições das pessoas e empresas caridosas.
Adriano B. Consentino foi sócio do Pacheco Neto Sanden Teisseire Advogados.