Uma relação ganha-ganha é aquela que beneficia todas as partes envolvidas. Normalmente usado para descrever ganhos financeiros em relações comerciais ou de consumo, esse conceito também pode ser aplicado a relações de emprego em que ambas as partes se beneficiam de um objetivo compartilhado.
Na lei brasileira, há uma política institucional que possibilita às empresas prolongar a duração da licença parental e abater tal benefício dos impostos incidentes sobre o lucro e pode ser vista como uma oportunidade de estender um direito social e aumentar a eficiência econômica.
Para entender melhor como fazer isso, primeiro, vamos dar uma olhada em algumas breves informações sobre aspectos conceituais das licenças maternidade e paternidade.
Licenças Parentais
Os programas de licença parental são projetados para apoiar o bem-estar da família, proporcionando aos empregados tempo livre para cuidar de um recém-nascido ou de uma criança recém-adotada.
Segundo o relatório “Cuidados no trabalho” da Organização Internacional do Trabalho (OIT), os programas públicos de licença parental visam fornecer “um quadro abrangente de princípios, direitos e orientação para definir e promover políticas de cuidados transformadoras e promover um trabalho de cuidados de boa qualidade”[1].
A licença parental inclui tipos como a licença maternidade e a licença paternidade, que variam em termos de duração, remuneração e proteções de emprego, de acordo com normas de Direito Internacional, Nacional e políticas internas das empresas.
Regulação Internacional
A licença-maternidade foi estabelecida pela Convenção de Proteção à Maternidade da OIT, 1919 (nº 3), que foi a primeira a reconhecer o direito à licença remunerada para as mulheres, independentemente da idade, nacionalidade ou estado civil. Atualmente, a Convenção de Proteção à Maternidade (nº 183), do ano 2000, é a lei internacional mais atualizada sobre o direito fundamental em análise.
A Convenção recomenda um período mínimo de licença de 14 semanas para mulheres empregadas e benefícios em dinheiro em um valor suficiente para garantir a manutenção da mãe e da criança em condições decentes (pelo menos dois terços dos ganhos anteriores da mulher). Também recomenda que os benefícios em dinheiro para licença-maternidade sejam pagos por meio da Previdência Social, não individualmente pelos empregadores.
A OIT também produziu a Recomendação sobre Proteção à Maternidade, 2000 (n.º 191), que sugere uma extensão da licença por 18 semanas e benefícios pecuniários equivalentes ao total dos rendimentos anteriores ao afastamento.
A licença-paternidade, por outro lado, atualmente não tem regulamentação legal explícita em Direito Internacional e depende somente de disposições legislativas nacionais e políticas internas das empresas. De acordo com o mesmo relatório da OIT, dados do ano de 2021 mostraram que, de um total de 185 países estudados, 102 ofereciam licença-paternidade, e somente em 41 deles seu custo total era atribuído ao seguro social, enquanto nos outros a lei atribui a obrigação de pagar ao empregador[2].
Uma Análise Comparativa de Previsões Legais
A licença-maternidade e a licença-paternidade são direitos sociais previstos na Constituição Federal do Brasil, garantidos aos trabalhadores urbanos e rurais.
A licença-maternidade tem duração de cento e vinte dias, com salário-maternidade equivalente a cem por cento da remuneração e proteção contra dispensa da empregada durante o afastamento[3]. O salário-maternidade é custeado pela Previdência Social porque, embora o empregador seja responsável pelo pagamento[4]. a lei prevê sua compensação com contribuições devidas à Previdência Social[5]. Por outro lado, a licença-paternidade[6] tem duração de cinco dias, é custeada pelo empregador e o empregado não tem proteção contra dispensa.
Em termos comparativos, observamos que na União Europeia (UE) as licenças e os benefícios são regidos por uma combinação de diretivas da UE e leis nacionais.
A Diretiva sobre Trabalhadoras Grávidas (2006/54/CE) prevê 14 semanas de licença-maternidade, durante as quais as empregadas têm direito a receber benefícios em dinheiro custeados pela Previdência ou pelos empregadores.
A Diretiva de Licença Parental (2019/1158/UE) prevê um mínimo de quatro meses de licença parental por pai/mãe, mas essa licença geralmente não é remunerada. Sob a mesma diretiva, o empregado tem o direito de retornar à mesma posição ou a uma posição equivalente após a licença. E como um avanço à Diretiva 2010/18/UE, esta diretiva estipula que os Estados-membros da UE devem fornecer licença-paternidade de 10 dias úteis.
Uma vez que cada Estado-Membro da UE pode dispor para além dos requisitos mínimos definidos pelas diretivas da UE, vejamos alguns dados comparativos sobre as diferentes licenças parentais na tabela seguinte[7]:
País | Duração da licença na lei nacional | Valor do salário-maternidade (% da remuneração prévia) | Fonte de custeio | |
---|---|---|---|---|
Brasil | Maternidade | 17 semanas (120 dias) | 100 | Previdência Social |
Paternidade | 5 dias | 100 | Empregador paga | |
Dinamarca | Maternidade | 18 semanas | 100 até um teto | Esquema assistencial |
Paternidade | 14 dias | 100 até um teto | Misto (pelo Estado até um valor fixo; o resto pelo empregador) | |
França | Maternidade | 16 semanas | 100 até um teto | Previdência Social |
Paternidade | 25 dias | 100 até um teto | Previdência Social | |
Alemanha | Maternidade | 14 semanas | 100 | Previdência Social |
Paternidade | – | – | – | |
Holanda | Maternidade | 16 semanas | 100 até um teto | Previdência Social |
Paternidade | 42 dias (6 semanas) | 100 na primeira semana, 70 por 5 semanas | Misto (100% pelo empregador na primeira semana, 70% pela Previdência por 5 semanas) | |
Noruega | Maternidade | 18 semanas (ou 22) | 100 até um teto | Previdência Social |
Paternidade | 14 dias | 0 | n/a | |
Espanha | Maternidade | 16 semanas | 100 até um teto | Previdência Social |
Paternidade | 112 dias (16 semanas) | 100 até um teto | Previdência Social | |
Suécia | Maternidade | 14 semanas | 77.6 até um teto | Previdência e Assistência Social |
Paternidade | 10 dias | 77.6 até um teto | Previdência Social |
Esta comparação fornece insights sobre como diferentes países estruturam suas políticas de licença parental, com variações em duração, compensação e mecanismos de financiamento. As seguintes conclusões podem ser destacadas:
- Duração: A licença-maternidade varia de 14 a 18 semanas. A licença-paternidade varia de alguns dias a 6 semanas, com a Espanha oferecendo a maior duração, de 16 semanas.
- Salário-maternidade: a maioria dos países garante 100% da remuneração anterior ao afastamento ou uma porcentagem até um teto, exceto a Suécia, que oferece 77,6%. Para licença-paternidade, os benefícios podem variar significativamente, de 0% na Noruega a 100% na Espanha.
- Fontes de custeio: para a licença-maternidade, a maioria dos países usa a Previdência Social, enquanto a licença-paternidade geralmente envolve contribuições mistas.
Uma Oportunidade sob a Lei Brasileira
Até agora, a discussão tratou dos benefícios das licenças parentais para os empregados. Vamos agora explorar como ela também pode beneficiar os empregadores.
A maioria dos países listados depende de sistemas previdenciários para custear as licenças, aliviando o ônus desses direitos sociais sobre os empregadores. Ainda assim, os empregadores normalmente não recebem benefícios fiscais diretos em função das licenças. Porém, sob a lei brasileira, há um benefício que o empregador pode derivar das licenças parentais.
A Lei Federal 11.770/2008 estabeleceu o Programa Empresa Cidadã, que oferece benefícios fiscais para empresas que estenderem a licença-maternidade e a licença-paternidade além dos mínimos legais.
A licença-maternidade de cento e vinte dias pode ser estendida, pelas empresas optantes, para cento e oitenta dias, e a licença-paternidade de cinco para quinze.
Em contrapartida, o programa concede uma dedução fiscal para as empresas que operam sob o regime tributário do Lucro Real[8], equivalente à remuneração integral paga nos dias de prorrogação de sua licença. Os custos de licença incorridos nesse período podem ser abatidos do Imposto sobre a Renda Pessoa Jurídica – IRPJ devido pela empresa.
Essa legislação também autoriza que a extensão do período de licença-maternidade, seja trocada por uma redução de 50% na jornada de trabalho diária, por cento e vinte dias.
Embora essa legislação não seja nova no ordenamento jurídico brasileiro, dados da Receita Federal do Brasil (RFB) informam que o número de empresas que operam sob o regime tributário Lucro Real e se beneficiam do Programa está longe de ser representativo: de um total de 331.693 empresas tributadas pelo Lucro Real[9] até julho de 2024, apenas 29.720 se inscreveram nele[10].
Um fator que pode ter contribuído para o baixo número de inscrições é a controvérsia sobre a incidência de contribuições previdenciárias patronais no período de extensão da licença. Contudo, recentemente o Supremo Tribunal Federal resolveu a questão, ao decidir que é inconstitucional a incidência de contribuição previdenciária patronal sobre o salário maternidade[11]. Isso significa que se antes havia incerteza sobre os custos relacionados à extensão da licença-maternidade, devido à potencial tributação, essa incerteza não existe mais.
Conclui-se, portanto, que a extensão da licença-maternidade por meio do Programa Empresa Cidadã pode constituir uma relação ganha-ganha entre direitos sociais ao empregado e incentivos fiscais ao empregador.
Nesse contexto, vislumbra-se também a possibilidade de as empresas recuperarem contribuições sociais indevidamente pagas sobre licenças-maternidade pagas no passado, após o julgamento acima relatado pelo STF.
Para uma consulta detalhada sobre como sua empresa pode se beneficiar desses programas, entre em contato com nossas Equipes Trabalhista e Fiscal.
Notas
[1] OIT. Care at work: Investing in care leave and services for a more gender equal world of work | International Labour Organization. Genebra: Organização Internacional do Trabalho, 2022. P.42.
[2] Ibidem, p. 96.
[3] Artigo 7º, inciso XVIII, da Constituição Federal.
[4] Esta disposição aplica-se apenas às relações de emprego, uma vez que a Previdência Social paga o benefício diretamente em outros tipos de relação de trabalho.
[5] Artigo 72, § 1º, da Lei Federal nº 8.212/1991.
[6] Artigo 10, § 1º, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.
[7] Dados extraídos do mesmo relatório da OIT, anteriormente citado.
[8] O Lucro Real é um dos três regimes tributários existentes no ordenamento jurídico brasileiro, além do Lucro Presumido e do Simples Nacional. Para entender qual é o melhor para o seu negócio, entre em contato com nossa Equipe Fiscal.
[9] Informação extraída de: Index of /CNPJ/regime_tributario
[10] Informação extraída de: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/acesso-a-informacao/dados-abertos/beneficios-e-renuncias-fiscais/empresas-habilitadas/empresa_cidada/view
[11] Informação extraída de TEMA 72 STF
Luccas Miranda Machado de Melo Mendonça é advogado no Pacheco Neto Sanden Teisseire Advogados.
Julia de Menezes Nogueira é consultora do Pacheco Neto Sanden Teisseire Advogados.